Bibliografia Principal: HERTZBERGER, A. (1964). Judaísmo
(1a. ed.), Rio de Janeiro, RJ: Zahar; KÜNG, H. (2004). Religiões do mundo
(1a. ed.). Campinas, SP: Verus; PIAZZA,
Waldomiro O. O povo de Deus na sua
história, literatura, mensagem religiosa. São Paulo: Loyola, 1980; RAMPAZZO, Lino A. Antropologia, religiões e valores
cristãos. São Paulo: Loyola, 2000. (2a. ed.). SCHULTZ, Samuel J. A História de Israel no Antigo Testamento. São
Paulo: Shedd, 2000. São Paulo: Loyola; GAARDER, Jostein; & Victor Helern; &Henry Notaker. O livro das religioes (1a. ed.), São Paulo: Schwarcz,
2002; WOLFF, Hans Walter. Bíblia Antigo Testamento. São Paulo: Teológica, 2003.
É propósito desse ensaio apresentar de modo simplificado as principais
características da religião de Israel, conhecida como Judaísmo. A relevância reside
no fato de que por meio dele se poderá descobrir os elementos de ligação entre
a esperança de Israel e sua realização escatológica em Jesus Cristo, tal qual
entendem os cristãos, bem como se poderá encontrar elementos para ampliar o
diálogo inter-religioso.
Histórico
A religião
de Israel se orienta sob a força da esperança e sua origem remonta os
primórdios da história do Oriente Médio. Tem sido estabelecida como tendo
origem desde Abraão, o seu patriarca mais antigo, que teria recebido o chamado
de Deus e peregrinado na terra de Canaã, por volta do século XVIII a.C., e ali
prosperando rapidamente. A mesma Divindade que o teria chamado de Arã prossegue
em manifestar-se “prometendo-lhe uma grande descendência e a posse de Canaã, se
lhe dedicasse um culto exclusivo.” (RAMPAZZO, 2000, p. 94).
De Abraão
veio Isaque, único filho de sua casa, e deste, veio Jacó, o qual teve doze
filhos, patriarcas das doze tribos da nação israelita. Após um período de
peregrinação, seguido do cativeiro no Egito, o povo é libertado por Moisés, o
profeta fundador da religião de Israel.
Segundo
Rampazzo (2000) e Schultz (2000), já por volta de 1250 a.C., o povo de Israel
estaria reunido aos pés do monte Sinai, onde se estabelece uma aliança com seu Deus.
A aliança é selada com um solene sacrifício e com o compromisso de fidelidade
às “dez palavras” (os 10 Mandamentos).
Após suas
quedas políticas e religiosas, como a invasão babilônica e a destruição do
Templo de Salomão em 586 a.C
, a religião de Israel se concentra na sinagoga. E com a dispersão da nação em 70 d.C., quando o povo de Israel ficou outra vez privado de seus ritos
no Templo e de sua terra, o ensino por meio da sinagoga se estabeleceu como definitivo. Todavia, com o retorno de Israel à
sua pátria, em 1948, e a fundação do novo Estado de Israel na
Palestina, ressurge o sonho da reestruturação da teocracia e do culto, para a criação de
circunstâncias favoráveis para a chegada do esperado Messias libertador.
A Religião da Aliança
Uma
definição do Judaísmo pode ser sintetizada do seguinte modo: “existe Deus,
existe um povo, existe uma aliança entre Deus e o povo.” (RAMPAZZO, 2000, p. 97). Hertzberger (1964)
sustenta que
“a mais adequada chave para a compreensão do
Judaísmo pode ser encontrada no conceito do ‘povo eleito’. Essa doutrina da
‘Eleição’ é um nistério – e um escândalo. Era já um mistério na Bíblia, que
atribuía a escolha divina não a qualquer mérito nato dos judeus, mas sim à
vontade incognoscível de Deus.” (HERTZBERGER, 1964, p. 12).
Essa aliança
com o povo judeu se inicia com Abraão. Como patriarca da religião de Israel,
Abraão é reconhecido como uma referência para o Cristianismo e para o
Islamismo. Dele não só veio Jacó, fundador do clã de Israel, mas também veio
Jesus Cristo.
Hans Küng
(2004) entende que Abraão poderia haver conhecido outros “deuses” antes de seu
contato com o Deus supremo, o Deus de Israel, porém “de forma alguma, algum
deus contrário e mau ou a parceria de alguma divindade feminina” (KÜNG,
2004, p. 185),
como ocorre nas cosmogonias do antigo Oriente Médio. O Deus de Abraão é o único Deus e nenhum outro a Ele se iguala.
Para Küng
(2004), a fé de Abraão é profundamente distinta também daquela das
religiões míticas da Índia ou das religiões sapienciais da China. Abraão é um
homem que não conhece a Deus “em si”, como os indianos afirmavam conhecer, nem
também simplesmente “acima de si”, como no entendimento dos chineses. Não: para
Abraão, “ele está na presença de Deus e com isso manifesta, em relação a Deus,
uma incondicional e inabalável confiança, ou seja, a fé.” (KÜNG, 2004, p. 185).
Contraposto
ao deus disperso da fé vedanta e ao deus inexistente de Buda, o Deus de Israel
se revela por meio de seus enviados (Abraão, Moisés, etc...). Pode-se afirmar
que “este Deus é único e apresenta-se concretamente dentro da história humana,
particularmente a de Israel.” (RAMPAZZO, 2000, p. 97).
Desse modo
se diz que o Judaísmo bem cedo se distanciou da linguagem mítica em sua religiosidade
e se estabeleceu sobre um sólido fundamento histórico, em sua Fé. Küng
(2004) explica que
“[...] naquelas narrativas bíblicas dos patriarcas transparecem com
precisão as condições sócio-culturais que devem ter vigorado na Palestina nos
cerca de cinco séculos que vão de 1900 a 1400 a.C. [...] ao contrário dos povos do Egito
e da Mesopotâmia, ele não associa sua história a nenhuma história mítica de
deuses.” (KÜNG, 2004, p. 184).
Moisés teria
sido seu profeta, guia e legislador. Sua visão da pessoa de Deus conduz a uma
religiosidade orientada para a fé e a esperança. Seu chamado é para trazer
liberdade ao povo de Israel, e a fé nesse Deus continuaria sendo a base
constante do povo de Israel: “um Deus experimentado não como um déspota ou um
senhor de escravos, mas sim como libertador e salvador.” (KÜNG, 2004, p. 189).
Dentro dessa
perspectiva histórica, Israel crê que Deus conduz tanto a história quanto ao
seu povo, dentro da história. E dentro de uma aliança, nesse caso, o Deus de
Israel exige exclusividade. O teólogo Hans Walter Wolff (2003) sustenta que nos
discursos dos escritos sagrados dos judeus, há uma batalha espiritual e uma
libertação que Deus mesmo executa em favor de Seu povo:
“... se trava uma árdua luta entre Iaweh e os outros deuses, lutas muito
diferentes daquelas travadas e habitualmente em um Panteão. Podemos antecipar o
resultado a guisa de tese: o Deus testemunhado por Israel tira o mundo da ordem
das divindades e preserva os homens de todas as épocas da divinização da
realidade mundana.” (WOLFF, 2003, p. 21).
Wolff (2003)
também afirma que o homem do Antigo Testamento tem sempre necessidade de ser
libertado pelos seus próprios deuses, mas é sempre o Deus de Abraão que o
liberta, através de Seus atos e testemunhos. Por isso, o apego de Israel ao seu
Deus se exemplifica em sua recitação do Shema:
“Shema Israel Adonai Elohenu Adonai echad!”
[“Ouve ó Israel o Senhor nosso Deus é o único Senhor!”]
A Prática Religiosa
O povo de
Israel se destaca pelo estudo e prática da Torah,
que é a Lei mediante a qual o seu Deus revelou ao seu povo a maneira deste ser
fiel.
O fiéis do
Judaísmo são observadores do sábado, da prescrição da pureza dos alimentos e
fazem uma separação rígida dos sexos.
Dentre os
seus rituais, destaca-se o rosh hashanah e
o kipur. Desde o dia primeiro do ano
judaico até aos dez deste mês, são conhecidos como dias de arrependimento,
quando o povo pode alcançar o perdão de Deus.
No Dia da Expiação (kipur), o fiel crê que “todo o mundo foi julgado diante do tribunal
celestial de Deus” e desse modo, o rosh
hashanah “é o período em que Deus
aceita e perdoa os corações arrependidos.” (HERTZBERGER, 1964, pp. 107-108).
Entretanto,
o Judaísmo crê que as culpas cometidas entre homens e homens só podem ser
expiadas pelo perdão entre homens e homens. “É opinião declarada e inaceitável
(sic) do Judaísmo que as orações dos homens, mesmo no yom kipur, só podem expiar os pecados entre eles e Deus.” (HERTZBERGER,
1964, p. 114).
Correntes de Pensamento
Na
atualidade, há pelo menos três correntes religiosas principais dentro do
Judaísmo:
Corrente 1:
o Judaísmo ortodoxo. Guardam os
mandamentos e a tradição de Israel e entendem que são revelação de Deus. Muitos
deles ainda se vestem à maneira dos camponeses da Polônia do século XVII.
Corrente 2:
o Judaísmo conservador. Procuram unir a ortodoxia ao Iluminisnmo e se
acha aberto à modernidade. Abraçam a modernidade como positiva, porém não abrem
mão da tradição como o uso da língua hebraica nos cultos e a prática religiosa.
Corrente 3:
os não religiosos: sendo este o maior
grupo dos três, não se unem a nenhuma sinagoga, não vivem a pratica religiosa ,
e na melhor das hipótese, celebra as festas por tradição. Rejeitam a fé e se apegam à esperança sionista,i.é: a formação de um estado de
Israel. Como exemplo desse tipo de Judaísmo secularizado, cita-se Karl Marx.
A Universalidade
Quanto ao
propósito da eleição, Hertzberger (1964) entende que Deus elege o Seu povo para
que este obedeça à Sua vontade e seja “um instrumento em suas mãos para
conseguir a redenção da humanidade.” (HERTZBERGER, 1964, p. 13). A esperança de
redenção da humanidade por meio da religião de Israel se manifesta na esperança
messiânica, i.é, na nova humanidade a ser restaurada com a vinda do Messias.
“Desde a catástrofe do exílio de Babilônia, desenvolveu-se uma forte
esperança de um mundo melhor, do ‘Reino de Deus’, em que Deus mesmo governará o
povo e o mundo, provavelmente por meio de um novo profeta (como Moisés), ou rei
(como Davi), chamado Messias (=ungido). Espera-se uma era em que Deus dará a
seu povo a grandeza e a felicidade.” (RAMPAZZO,
2000, p. 97)
O seu modo
de vida é “o sinal característico de sua diferença”, mas pode ser que “no fim
do tempo, já num mundo completamente redimido, essa diferença única talvez
venha a desaparecer.” (HERTZBERGER, 1964, p. 18). Essa redenção do
mundo somente ocorrerá com a chegada do Messias. Por isso, se entende que “o mundo ainda não
está redimido, [pois] o Messias ainda não surgiu.” (HERTZBERGER, 1964, p. 18).
Gaarder
(2002), em consonância com Rampazzo (2000), define esta antiga esperança
messiânica pelos fieis de Israel como o restabelecimento de Israel como “uma
grande potência, e seu povo passaria a viver em eterna felicidade.” (GAARDER,
2002, p. 103). Na atualidade, tem-se sustentado que o Messias “é mais uma ‘era messiânica’ do que uma pessoa bem
determinada.” (RAMPAZZO, 2000, p. 97).
Essa fé foi
fortalecida pelo ministério dos profetas com ênfase em três pontos: monoteísmo,
aliança e messianismo. Dentro dessa perspectiva, segundo Rampazzo (2000), os
judeus aspiram a universalidade dentro de sua diversidade:
“as famílias humanas poderão viver em paz, numa comunidade mundial, só
abrindo-se à ‘universalidade’, ao mesmo tempo, respeitando a própria
diversidade cultural. Então, poderá se realizar, num certo sentido, a palavra
do judeu Jesus de Nazaré: ‘a salvação vem dos judeus’.” (RAMPAZZO, 2000, p. 101)
O Destino do Fiel
Na religião de Israel, se percebe uma diferença em relação ao Induísmo e
Budismo quanto à crença no destino humano e o sentido da História. Enquanto
naquelas religiões , a história é cíclica e envolta em constantes recomeços,
para o Judaísmo, a História é linear e caminha para seu termo que é ao mesmo
tempo uma redenção. A esperança de Israel se projeta na história, para um tempo em
que o Messias inaugurará uma nova Era para toda a Humanidade.
Tem-se
sustentado que a nação israelita não tenha se valido de uma esperança
além-túmulo, em seu começo e se amparava apenas numa bênção material para o
fiel.
“... a princípio, o israelita só pensava nos benefícios terrenos em
recompensa de sua fidelidade à Lei: saúde, longa vida, muitos filhos, boa
fama... pouco a pouco, ensinado pelos profetas e pelos acontecimentos da vida,
que mostravam freqüentemente o justo pobre e humilhado, o ímpio rico e
orgulhoso, o israelita passou a ver o sheol com os olhos críticos, rejeitando o
destino igualitário do tumulo.” (PIAZZA, 1980, p. 50).
Piazza
(1980) entende que se começou ver entre o povo judeu um destino diferenciado
para o justo somente após o cativeiro babilônico em 586 a.C., quando as
esperanças de uma retribuição terrena foram definitivamente abaladas com a
falência da nação. Daí se teria firmado na mente do israelita fiel a certeza de
uma retribuição além-túmulo, com um castigo para os ímpios e uma recompensa
para os bons. Em que situação antropológica o fiel seria recompensado as
Escrituras Sagradas não revelavam de modo explícito. Todavia, podem-se notar ecos de uma
ressurreição da carne no livro de Jó (19.26) e de Daniel (12.13).
Alguns
sugerem que a esperança antropológica de uma ressurreição física dentre os
mortos, foi afirmada de modo mais enfático por ocasião do contato da nação de
Israel com a civilização grega, na época da dominação dos Selêucidas (século II
a.C.). Pode-se supor que isso teria se dado como uma reação, frente a
antropologia grega que não baseava sua esperança numa ressurreição dos mortos,
e sim numa transmigração da alma.
Porém, o que
se sabe ao certo é que essa crença judaica na ressurreição não era unificada,
sendo que já nos dias do Cristianismo primitivo, havia alguns judeus que
rejeitavam essa idéia, como a seita dos saduceus, “... que diziam não haver
ressurreição” (Mateus 22.23).
Concluindo
Na
atualidade, a esperança de Israel em relação ao seu destino é apresentada como
uma bênção possível através da aliança de Deus com seu povo, extensiva a toda a
humanidade. Desse modo, a redenção de Israel não é algo exclusivo da nação.
Espera-se que dos tempos messiânicos, venha a ocorrer a partir de sua nação,
uma aurora de salvação abarque o mundo todo. Assim, a sua esperança se
fundamenta na intervenção de Deus na história, culminando numa Era redentiva
para todas as nações da Terra. O sentido da história humana se realiza neste
plano de existência, que alcançará uma plenitude sob a soberania de Deus.
O
Cristianismo prega que essa esperança do Judaísmo se centraliza em Jesus de Nazaré que redimiu
a Humanidade com Sua morte e ao ressurgir dos mortos, trouxe a possibilidade de
vida plena a toda a Humanidade. [Claudio Soares Sampaio]
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