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A Esperança nas Religiões 2: O Hinduísmo


Bibliografia principal: GAARDER, Jostein; & Victor Helern; &Henry Notaker. O livro das religiões. São Paulo: Schwarcz, 2002; ELIADE, M. História das crenças e das idéias religiosas tomo II: de Gautama Buda ao triunfo do Cristianismo. Rio de Janeiro: Zahar, 1a. ed., 1979. ELIADE, Imagens e símbolos: ensaios sobre o simbolismo mágico-religioso São Paulo: Martins Fontes, 2a. ed., 1996; KÜNG, H. Religiões do mundo, 1a. ed. Campinas, SP: Verus, 2004; RAMPAZZO, Lino A. Antropologia, religiões e valores cristãos. São Paulo: Loyola, 2a. ed., 2000. COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL. Teologia da redenção. São Paulo: Loyola, 1a. ed., 1996; WELLS, H. G. História universal em 8 vol. São Paulo, SP: Companhia Editora Nacional, 7a. ed., 1968.

É propósito desse ensaio apresentar de modo simplificado as principais características da religião da Índia, conhecida como Hinduísmo. A relevância reside no fato de que por meio dele se poderá descobrir os elementos de ligação entre a esperança dos Hindus e sua realização plena em Jesus Cristo, tal qual entendem os cristãos. Desse modo, esse estudo pode promover alguns elementos para ampliar o diálogo inter-religioso. 

Uma Religião Progressiva


O Hinduísmo se construiu sob o sinal da esperança de vida em resposta ao enigma da morte. Tem sido apresentado como uma das mais antigas das grandes religiões do mundo, não sendo produto de um fundador, mas de “uma evolução gradual e da caminhada de numerosos mestres espirituais que viveram na Índia ao longo dos séculos” (RAMPAZZO, 2000, p. 69); e ainda como um “mosaico de crenças e práticas religiosas que afirma oferecer à raça humana a redenção e a salvação” (Comissão Teológica Internacional, 1996, p. 15). 

O Hinduísmo vem de reflexões filosóficas e práticas ascéticas que remontam anos de dedicação do homem em busca de Deus. Assim, ele não possui um credo único, sendo mais uma miscelânea de seitas em seu ambiente. Porém seu núcleo se forma sobre três princípios: dharma, samsara, e carma. Isso implica que para o Hinduísmo, todo o universo é regido por uma única lei (o dharma). O seguimento dessa lei universal liberta o homem do samsara, o ciclo de reencarnações. São as ações (carma) que determinam sua existência futura. É com base no “ato” uma espécie de “sedimentação da vida anterior, o carma, que uma alma renasce para graus superiores ou inferiores dos seres vivos” (RAMPAZZO, 2000, p. 70).

Embora essa seja uma visão hindu, Küng (2004) entende que essa crença “numa reencarnação cíclica dos mortos, em uma migração das almas, não nasceu na Índia. Desde muito cedo ela faz parte de numerosas tradições culturais do mundo” (KÜNG, 2004, p. 67).

De fato, No antigo Egito era comum a presença dessa crença na vida após a morte. Os túmulos eram preparados como morada dos mortos. Eliade (1979) percebe na China antiga, a presença de práticas religiosas como culto aos mortos, e cerimônias de “libertação do cadáver (ELIADE, 1979, p. 47), e reunião com pessoas ditas “imortais”, numa perspectiva de vida após a morte. Várias idéias estavam associadas ao desenvolvimento da esperança hindu para a vida após a morte. Porém, para Eliade (1979), é a partir do Bramanismo e Hinduísmo que se iniciam as primeiras filosofias e técnicas de salvação.

O Destino Humano


Küng (2004) demonstra que no inicio, Acreditava-se que com a cremação do cadáver, “os mortos imediatamente chegavam ou à condenação eterna do mundo inferior ou à felicidade do paraíso no mundo celeste.” Mas ele acrescenta que ao passar dos anos, se começou a por isso em dúvida: não haveria a possibilidade de que mesmo no céu pudesse ocorrer “‘nova morte’ e que os mortos tivessem que voltar à terra e assumir uma nova existência para de novo saírem dela e, com a morte, retornarem para o céu?” (KÜNG, 2004, p. 67). Desse modo, a visão cíclica da vida humana teve curso dentro do Hinduísmo.

Para superação desse ciclo que é uma prisão, o Hinduísmo desenvolveu três vias de libertação, que são três caminhos diferentes para a graça:

1) a via do sacrifício. Por meio de sacrifícios se busca alcançar a felicidade terrena, grande descendência, para boa saúde, etc...;

2) via da compreensão e do conhecimento. Tem sua base na idéia de que é a ignorância do homem que o amarra ao ciclo de reencarnação.

3) via da devoção. Gaarder (2002) afirma que atualmente, predomina na Índia a prática da terceira via. Ela propõe que em lugar da ascese e da contemplação, segundo o bhagavad gita (livro sagrado), se o fiel se dedica a Deus e não espera recompensa material, será agraciado por Deus e libertado da transmigração.

Embora a esperança hindu para o sentido da vida pareça algo bem definido em seu credo, apesar de tudo, Küng (2004) afirma que “na Índia, não se teve nem se tem muita clareza a respeito de como imaginar o destino dos mortos.” (KÜNG, 2004, p. 67).

Histórico


Como se entende a progressão religiosa da esperança de redenção dentro do Hinduísmo?

Gaarder (2002) apresenta que no começo, se pensava que o ciclo de reencarnações fosse algo positivo e essa passou a ser a busca religiosa do Hinduísmo. Essa esperança de continuidade terrena seria a característica da primeira via redentiva hindu, na qual se pregava a necessidade de que se fizessem sacrifícios para garantir ao fiel um ciclo maior de reencarnações. Porém, Gaarder (2002) afirma que tempos depois, essa se tornou uma visão negativa, sendo que a busca religiosa atual é a quebra do ciclo de reencarnações. Nota-se que da esperança de uma continuidade de reencarnações terrenas, há uma esperança que se projeta para o além, numa cessação da existência histórica.

Para expressar essa idéia, fez-se uso de uma linguagem mítica: dizia-se que a lua era a porta para o céu e ali havia um guardião que fazia perguntas aos mortos sobre sua vida; as respostas dadas decidiriam o destino do morto. Mais tarde seriam, sobretudo pelos atos de sacrifícios realizados pelos mortos que se determinaria o seu destino após a morte. A palavra -chave agora era “ação e seria da ação que a tradição hindu da doutrina do carma (em sânscrito, kr: ‘ agir’ ‘fazer’) iria impor-se.” E desse modo, começa em ampla medida a ocorrer uma “libertação das idéias míticas e rituais.”

Küng (2004) afirma que esse é “processo complexo” que ainda pode ser acompanhado nos Upanixades, os escritos filosóficos que surgiram na Índia desde o século VIII a.C e que vieram a substituir a tradição védica. Mas atualmente, “o critério decisivo para o tipo de reencarnação passou a ser simplesmente a conduta de vida, o reto agir do morto enquanto viveu.” (KÜNG, 2004, pp. 67-68).

O Hinduísmo alcançou destacado reavivamento espiritual pela presença do jovem Krishna, que abriu uma expansão do movimento chamado Hare-Krisnah. A promessa de redenção neste "Hinduísmo Vedanta" (pós-Veda) está ligada à esperança da liberdade de uma escravidão da qual não pode livrar-se senão através de uma dedicação total à divindade.

O Ciclo do Eterno Retorno


A visão cíclica hinduísta acerca da vida abarca também a sua noção de tempo e história. Encontra-se no Hinduísmo o “mito do eterno retorno”. Mesmo “os deuses não conseguem esgotar o Tempo, pois os deuses não são eternos e as criações e recriações cósmicas prosseguem ad in infinitum.” (ELIADE, Imagens e símbolos: ensaios sobre o simbolismo mágico-religioso, 1996, p. 62).. Para o hindu, o tempo seria absoluto; tempo e história refletem o ciclo do mundo e do universo: como o das estações, do nascer e por-do-sol, das fases da lua, etc... Essa visão concebeu uma idéia mítica do fim do mundo.

Küng (2004) apresenta um ensino do chamado Código de Manu no qual se relata que o mundo possui quatro eras (yuga), e que a humanidade atualmente se encontra na última dessas quatro, no sexto milênio do Kalyuga. Porém, não há nenhum espírito apocalíptico dentro do Hinduísmo. Pois de acordo com um sistema de contagem imaginado anteriormente, depois do ano 2000 d.C. irão se passar ainda 426.000 anos humanos, até que depois de 12.000 nos divinos, ou seja, 4.300.000 anos humanos, uma era divina (mahayuga) chegue ao fim!

“E – para Brâhman – mil dessas eras divinas são apenas um dia, a que depois de uma destruição do mundo se há de seguir uma longa noite bramânica. Só então um período do mundo estará concluído! Fecha-se assim o ciclo de eras iguais que se desenrolam eternamente – para logo começar tudo de novo.” (KÜNG, 2004, p. 68).

Porém Küng (2004) entende que essas “são teorias muito especulativas”, e que, com o tempo, no Hinduísmo começou-se a perceber uma insatisfação com uma visão totalmente mitológica do mundo passando-se a “uma compreensão filosófica, em busca de uma unidade original que estaria por trás e por dentro das coisas: Tad Ekam, ‘o Uno’”. É dele que diz, por exemplo, aquele hino da criação do Rig-Veda (X, 129, 2): “que no princípio não havia nem ser nem não-ser, mas apenas este Uno e nada mais além dele.” (KÜNG, 2004, p. 69).

Os Upanixades


Para Küng (2004), os Upanixades representam uma evolução religiosa destacada. A compreensão hindu acerca da divindade e do destino humano parte desde suas práticas sacrificais e esotéricas (os Vedas) com seus “tateios” e “tentativas de apreensão” (no dizer de Küng, 2004) em conceitos da realidade primeira e última, até os Upanixades, considerados como “o fim dos vedas”, como encerramento da parte revelada (shruti) da tradição religiosa da Índia. Mas para Küng (2004), mesmo nos Upanixades “os textos apresentam diversos estilos e diversas concepções – “a começar pelas perguntas sobre o destino individual do homem, chegando até a relação do ser humano com o Absoluto.” (KÜNG, 2004, p. 69).

Houve em relação ao Hinduísmo, uma busca pela unidade dos muitos deuses e poderes na condução dos mais variados fenômenos desse mundo. Kúng (2004) entende que foi o que ocorreu na Índia, já cerca de 1.000 anos a.C., nos Upanixades. Eles agora mostravam o ponto central:

“o homem precisa romper a superfície visível das coisas e olhar para dentro de si mesmo. No mais profundo de si, quando, por assim dizer, ele fecha os olhos e se volta para dentro, ele há de encontrar em si mesmo a origem, a razão primordial do ser, o Uno primordial, o Brâman. E sentirá que o Brâman e o atmân (como é chamada na Índia, a alma, o espírito), em última análise, são uma só coisa. [...] e a parti daí, os místicos passaram a clamar: ‘buscar a Deus em todas as coisas – e antes de tudo, buscar a Deus em ti mesmo’. ” (KÜNG, 2004, p. 70). 

Está claro o sentido panteísta da natureza de Deus e do homem. Entretanto, Küng (2004) apresenta que mesmo nos Upanixades podem ser encontrados diversos textos “que dão testemunho de uma piedade teísta revigorada que se manifesta de uma forma muito consciente: a salvação e redenção de cada um dependem da fiel entrega a um Deus entendido como pessoal.” (KUNG, 2004, p. 75). Por isso, também se diz que, no Hinduísmo, se percebe um misto de politeísmo e panteísmo, que às vezes assume um ar de monoteísmo místico. Enquanto o culto à divindade Brâhman se extingue de modo progressivo, surgem Vishnu e Shiva “que passam a ocupar o centro de uma religião própria. Vishnu é agora invocado como o Excelso (bhagavan) e Shiva como o Senhor (ishvara). [...] são onipotentes e oniscientes.” (KÜNG, 2004, p. 75). Mas no entender de Küng, (2004), essas são apenas manifestações da mesma divindade, “que a um só tempo cria o mundo (Brahman), o conserva (Vishnu) e o destrói (Shiva).” (KÜNG, 2004, p. 76).

Correntes de Pensamento do Hinduísmo


Na atualidade se destacam três modelos acerca do Deus pessoal com o Absoluto e a relação entre Deus e o mundo, no Hinduísmo:

Modelo 1. “O Absoluto e o mundo são a mesma coisa”. Essa idéia propagada por Shankara, no século IX d.C. Para Shankara, só há um deus: o Uno, o Brâhman, idêntico a atmã, a alma. O mundo é apenas aparência: é maia. “Não se alcança, portanto, a redenção pelo conhecimento inferior nem por obras rituais e morais, mas unicamente pelo conhecimento místico mais elevado do Uno e do Todo.” (KÜNG, 2004, p. 77).

Modelo 2. “O Absoluto e o mundo são inteiramente separados.” Essa é a visão dos “filósofos da separação”, ou “dualistas”. O mais sagaz deles teria sido Madhva, um opositor de Shankara, no sec. XII. Para ele, o Brâhman é ser, consciência e é beatitude a um só tempo, ele é o Uno e único Deus, chamado Vishnu. Mas o mundo não pode ser Brâman, pois é mau, imperfeito, por isso é “inteiramente real a diferença entre Deus e o mundo, Deus e a alma.” Desse modo, a linha hindu Madhva defende o chamado “dualismo radical.” (KÜNG, 2004, p. 78).

Modelo 3. “o Absoluto e o mundo são um na diversidade.” Adepto de Shankara, Ramanuja, no século XII, compartilha a idéia de Shamkara: para ele, a redenção vem pelo conhecimento místico mais elevado. Mas rejeita o seu “monismo indiferenciado: na verdade, o Brâhman é um, e não-dois (adwaitam), mas ele não é impessoal, não é sem propriedades.” Brâhman se identifica com o “Deus pessoal que desde a eternidade cria o mundo e o conserva que o dirige a partir de dentro e que novamente o retoma.”

Ramanuja reconhece que nos Upanixades, “a adoração de um Deus pessoal é a união mística com ele.” Apresenta o conceito de relacionamento com o Deus pessoal na base do amor, da confiança e da adoração: numa palavra, o conceito de entrega (abhakti). Küng entende que Ramanuja “estabelece na prática, um vigoroso movimento de piedade monoteísta, que se oferece a um único Deus – seja ele Vishnu, Shiva ou uma deusa. A esse movimento deve pertencer o futuro.” (KÜNG, 2004, p. 78).


Considerações finais


O Hinduísmo é uma religião que surge como uma resposta humana para o problema do sofrimento e da morte e busca promover a libertação do homem. Mas ainda assim, essa libertação não é integral. Pode-se dizer que nela se busca uma libertação da história, não histórica, no sentido de que a própria história nunca está redimida de modo definitivo. Busca-se uma redenção do espírito, não uma redenção integral do ser. O corpo com sua rede de relações, que ama, pensa, sofre e que é ao mesmo tempo o ser na história, esse não será redimido. Assim, a realidade da vida em sua totalidade permanece em escravidão ad infinitum. A história humana não tem sentido nem finalidade perante a divindade e a plenitude da vida não se realizou, uma vez que a vida se mostra um estado de escravidão, e Bhrâman não redime a história, redime o espírito. No Hinduísmo, a vida plena, ou Homem Novo, não se manifestou ainda, e se apresenta em estado de promessa.

Como o Cristianismo se posiciona diante do Hinduísmo? Enquanto que no Hinduísmo se perceba um processo evolutivo, uma busca de Deus por meio de tateios, filosofias e técnicas, o Cristianismo sustenta que a Divindade se revelou em carne e é uma Pessoa, Jesus Cristo. O Cristianismo é então uma revelação de um Deus que veio ao encontro do Homem. Também o Cristianismo propõe uma devoção plena à Divindade. Todavia, essa devoção em si mesma não promove a redenção humana. O sofrimento humano é o resultado de uma queda espiritual da Humanidade, com suas conseqüências universais. Desse modo, homem caído é incapaz de redimir-se a si mesmo. Porém, através de Jesus, Deus se fez homem e Ele mesmo redime Sua Criação. Ele é Aquele que põe termo ao mal e ao sofrimento pela ação de Jesus, em Seu sacrifício, mediação e através de Seu retorno a este mundo. No Cristianismo não há uma visão cíclica, mas linear, da História. No fim do tempo, Deus redimirá de modo definitivo Sua Criação. Ao homem está ordenado morrer apenas uma vez, e depois disto o Juízo e uma ressurreição da carne para a vida eterna ou para a morte eterna, na segunda vinda de Jesus Cristo. Essa libertação divina é definitiva e abarca sua existência de modo pleno: seu corpo, sua história e seu mundo. [Claudio Soares Sampaio].

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