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Teologia do Antigo Testamento: Três Marcos Epistemológicos

Penso que para alguém que se interessa pelo estudo da Teologia do Antigo Testamento, três obras deveriam ser colocadas na lista de leitura. Esta lista é feita com base em minhas leituras recentes. Embora divergentes em alguns aspectos, todas possuem uma proposta inovadora acerca do fazer teologia voltada para as necessidades atuais da comunidade. Seguem três reações de leitura:

I. Gerhard Hasel (Ano: 1991, 4a Edição)

  


O livro Teologia do Antigo e Novo Testamento, do erudito Gerhard Hasel (Academia Cristã/Paulus: São Paulo, 2008), é uma reedição e ampliação da primeira edição, publicada nos anos 80'. A nova edição contém 06 capítulos divididos em 490 pags. Além de possuir mais páginas em seu segundo capítulo, tem o acréscimo de uma segunda parte, dedicada à Teologia do Novo Testamento. A obra se posta no centro do debate acadêmico acerca daquilo que o autor percebe como uma “crise” em torno da matéria. O livro é bem objetivo e se destaca pelo vigor da linguagem erudita e ao mesmo tempo, descomplicada. A experiência do docente se nota pela maneira como o autor domina a matéria, estabelecendo um diálogo entre as várias vertentes. Os capítulos se ajustam a uma estrutura bem definida e a propósitos claros. Hasel busca descrever os motivos da dita “crise” que atinge a matéria Teologia do Antigo Testamento, para enfim, descrever sua própria solução do problema. Há uma preocupação em relação ao radicalismo que polariza os estudos, seja pelo conservadorismo, seja pelo liberalismo. Para ele, os tantos problemas que geram a “crise” estão relacionados de modo específico com a questão metodológica (cap.2), com a ênfase no método Histórico-Crítico (cap. 3), com a incerteza acerca de um tema “central” para o AT (cap. 4) e com a dificuldade de estabelecer conciliação entre os dois Testamentos (cap. 5). Na sequência, avalia a problemática em torno de 10 abordagens históricas, para, de forma dialética, apresentar sua proposta, definida por ele mesmo como Abordagem Múltipla (cap. 6).

Avaliando a obra, pode-se notar alguns pontos fortes. Destaco a farta bibliografia, o rigor metodológico que segue um propósito bem definido, a estrutura da obra em partes que se interligam bem como a profundidade e erudição ao dialogar com todas as vertentes mantendo a ética teológica, ao reconhecer os elementos positivos de cada abordagem apresentada. Sua análise não se perde em um denominacionalismo piegas, apesar de defender a visão conservadora, mantendo uma perspectiva histórico/teológica do AT.

Como pontos fracos, se percebe o fato de não deixar bem claro a definição do método de abordagem, embora seja alusivo o uso do método Gramático- Histórico. A proposta canônica de tomar o livro em sua forma final tem o agravante de não especificar bem se sua postura se relaciona exclusivamente como uma resistência à a aridez das tentativas da reconstrução dos textos pela crítica liberal ou se tenciona evitar o debate com as literaturas deuterocanônicas e com as cosmogonias orientais que conflitam com os relatos bíblicos. Seja pela influência ou pela resistência, o AT tem relação direta com estas literaturas oriundas da cultura do Antigo Oriente Medio, e precisa haver diálogo.

Enfim, a obra é concisa e atende bem a proposta, a saber, introduzir o pesquisador no centro do debate acadêmico, além de mostrando ao mesmo tempo o rumo a seguir.

II. Paul House (Ano: 1998)



A obra Teologia do Antigo Testamento de Paul House (Vida: São Paulo, 2005, 760 páginas) está dividida em três partes: 1) Uma avaliação epistemológica na qual serão apresentadas as diferentes abordagens em torno da matéria ao longo da história; 2) A abordagem de cada livro bíblico em torno da figura de Deus; 3) Uma síntese atualizada dos estudos acadêmicos desde 1993. Foi publicada nos EUA em 1998, e por isso, sua bibliografia não está distante das propostas atuais. Desde sua Introdução, a obra se propõe a atender um público específico, a saber, universitários e seminaristas, embora sejam adequados para estudiosos e professores de seminaristas. Talvez por isso, ao introduzir a matéria, House faça uso de uma linguagem fácil, sem muita erudição. Na parte analítica o método que orientará o autor é aquele introduzido por Brevard Childs, definido como “Canônico”, embora se note influências do método "transversal" inaugurado por Eichrodt, e pela multiplicidade de recursos, como em Hasel. O estilo é descritivo, estruturado em tópicos e centrado na pessoa de Deus. Ao buscar uma formulação de seu programa, ele deixa implícito que caminhará mormente sob a guia dos conceitos elaborados por Brevard Childs e Gerhard Hasel, salvo poucas alterações.

Pode-se notar os seguintes pontos fortes: O uso de uma linguagem acessível ao público proposto, sem perder-se nas terminologias e debates vagos, tornando a obra adequada para sua proposta. O estilo descritivo em sequência linear facilita o acompanhamento das ideias e propostas em torno do tema. Há equilíbrio nas avaliações, ao respeitar as contribuições anteriores, avaliando os pontos positivos de cada autor. Valoriza a autoridade das Escrituras e segue um plano bem definido.

Alguns pontos negativos também podem ser elencados: Embora bastante instrutivo em seu começo, House praticamente reescreve o conteúdo epistemológico da obra de Gerhard Hasel, o que faz sua leitura um tanto quanto repetitiva. Seu foco numa abordagem canônica pode levar a excessos, uma vez que sugere uma abstenção de análise dos livros deuterocanônicos, e abre um problema em relação ao questão do cânon, pois tanto os achados de Qunrã quanto o texto da LXX demonstram a existência de um cânon alternativo, em relação à Bíblia Protestante. Embora se note que esta não é a proposta do autor, há um risco de tender para o fundamentalismo ou mero biblicismo.

Enfim, a obra de House é uma obra que traz um sabor de novidade e traz um apelo à vivencia da fé por meio de espiritualidade genuína. Uma boa proposta, diante da aridez percebida em tantas obras em torno da matéria.


III. Walter Brueggmann (Ano: 1997) 



A obra “Teología del Antíguo Testamento” de Walter Brueggmann (Ediciones Sígueme: Salamanca, 2007, 816 páginas), é uma obra atual em todos os aspectos e busca sistematizar sua proposta de acordo com as tendências hermenêuticas recentes, com foco no pós-modernismo. Para explicar os porquês de sua proposta, Brueggmann parte da ruptura histórica da disciplina para com o “Movimento de Teologia Bíblica” (Walther Eichrodt e G. Von Rad). Ele estabelece o ano de 1970 como o marco histórico do rompimento pelo fato de que neste mesmo ano ocorre a publicação da última obra de Von Rad e ao mesmo tempo se dá a publicação do livro de Brevard Childs com sua proposta antagônica, a Teologia Canônica. Apresenta a influência de James Barr, que ao lado de Childs vai estabelecer a necessidade de uma comunicação cognitiva na transmissão das Escrituras, que atendesse as necessidades da igreja. O fator definitivo, segundo Brueggmann, foi a obra “O Colapso da História” (1977), de Leo Perdue, que confronta o pensamento de Hegel, principal influenciador da “era Von Rad”. O dito “colapso”, de acordo com Perdue, teve como estopim a Segunda Guerra, que levou à rejeição do padrão histórico bem-ordenado de Hegel e abriu caminho para um pluralismo histórico, com base na individualidade de cada um. E é com essa visão pluralista que as propostas teológicas doravante deverão trabalhar. Apresenta propostas recentes, como o Planejamento Sociológico (Gotward), mas dá destaque à Crítica Retórica (Muilenburg e Ricoeur). Brueggmann entende que Perdue gera o “colapso” não só do “historicismo” como também dos pressupostos culturais que lhe davam apoio, para ceder lugar às variadas metodologias de colorido artístico, de olhar ecumênico, flexíveis, contextualizadas, e não-transcendentais, valorizando mais o discurso e estrutura do texto.

Alguns pontos fortes podem ser detectados, tais como a superação do discurso Histórico-Crítico, a valorização do pensamento e escrita judaica, a percepção de que a Teologia deve falar à comunidade, a tentativa de limites no discurso, na busca de um equilíbrio entre o criticismo rígido e a ênfase canônica.

Por outro lado, elementos negativos também afloram, tais como a proposta de que a visão de Deus deverá ser ditada de modo pessoal e particular. Embora seja severo para com o discurso crítico, cede à hipótese wellhauseana acerca das fontes. E por fim, propõe que a retórica das Escrituras não tem um fim definido e propósito certo. É apenas “literatura”.

Brueggmann é inovador e estrutura bem sua proposta. Ainda que chegue à essência do problema, não traz solução à ele, embora abra novas perspectivas para este tempo.

Concluindo


Estas foram minhas sugestões com base em minhas leituras recentes. Poderão entrar na lista outros volumes, a gosto de cada pesquisador. Mas estas são as mais acessíveis e que trabalham as questões epistemológicas recentes em torno da matéria.

Obs : A obra de Brueggmann  será lançada no  inicio de Agosto de 2014, pela Editora Academia Cristã, pelo preço de R $ 170,00



http://pastorclaudiosampaio.blogspot.com

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