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Espiritualismo e Materialismo e a Esperança Cristã: Convergência e Desencontro


O surgimento do marxismo como doutrina bem como do espiritualismo científico se encontra entrelaçado com a história da Europa, especialmente da França. Tentaremos esboçar isso no presente ensaio. O propósito é demonstrar que mesmo buscando caminhos adversos, nenhuma dessas ideologias podem atender as exigências da esperança humana de forma integral, como proposto pelas Escrituras, a esperança cristã.

O contexto do surgimento dessas ideologias está no fim do século XVIII e início do século XIX. Face às insatisfações do povo para com o Clero, que ao lado da nobreza sustentava um sistema opressor que lhes conferia vantagens, ocorre a Revolução Francesa e a sociedade francesa se reestrutura, criando as bases da chamada Idade Contemporânea.

Quando em 1798, depois de derrotar o exército do Papa Pio VI e pôr fim à Inquisição, Napoleão Bonaparte toma os poderes temporais da igreja e promove a decadência política do Catolicismo não apenas da França, como também por toda a Europa. Essa ausência religiosa é grandemente sentida pelos franceses, que se tornam abertos a dois principais sistemas filosóficos que buscarão orientar o pensamento da sociedade, em contraponto com a antiga doutrina cristã, proclamada pelo Catolicismo.  Nesse contexto, surgem tanto o Espiritismo quanto o Marxismo.

Espiritismo - Propagado pelo Professor Denizard Rivail, que mais tarde tomaria o nome de Allan Kardek, o Espiritismo assumia uma linguagem científica com base nos mais recentes ensinos de Charles Darwin, e por meio deles propagava a ideia de que o homem, por meio da morte e da reencarnação, caminharia sempre para uma melhora, em uma evolução ad in infinitum. De acordo com Leandro Sarmatz / Alceu Nunes, em artigo da Superinteressante
Típico rebento do século XIX – o mesmo das teorias evolucionistas de Charles Darwin, da Tabela Periódica, da redescoberta das filosofias orientais e do Positivismo de Auguste Comte –, o Espiritismo consegue a proeza de mesclar Catolicismo primitivo (caridade), Budismo (reencarnações), Darwin (evolucionismo) e um caldeirão de credos esotéricos que estavam em plena voga nos anos 1800 – e que geraram filosofias tão diversas como o Espiritualismo de Emannuel Swedenborg e a Teosofia de Madame Blavatsky.
Alcançando popularidade na França, avançando por toda Europa de forma rápida, qual teria sido a razão de sua propagação tão repentina? Penso que isto, por certo se devia em parte pelo livre acesso, pela simplicidade de seu culto, e penso que acima de tudo, pela sua proposta de despojamento dos interesses materiais, uma vez que não dependia de uma casta religiosa, nem exigia dinheiro de seus seguidores. A prática do Espiritismo era proposta apenas como uma vida em caridade e despojamento. Para Kardec, de nada adiantaria crer nos ensinos dos espíritos, se o homem não desse um passo em direção à melhora e se tornasse melhor  para o seu próximo. Tal religiosidade, ao que parece, era adequada aos anseios do povo europeu, e poderia de fato ocupar a lacuna deixada pelo Catolicismo.

Uma vez que  o espiritualismo parecia adequado às esperanças dos europeus, qual a razão do surgimento do Marxismo? O que se nota é que a proposta espiritualista de Kardec deslocava a esperança de redenção vista pelos cristãos de seu centro. Kardek não anunciava uma redenção histórica, mas  despojava o homem de tudo, alienando-o até mesmo de si mesmo, de sua vida, ao propor uma existência concreta apenas no "mundo dos espíritos". Como uma espécie de neocristianismo, o Espiritismo aparentemente promovia apenas a salvação do espírito, e nisso, Marx se contrapôs, ao propor uma revolução histórica, voltada unicamente para o material. Sua origem se relaciona diretamente com o meio de onde brota a doutrina Espírita.

Marxismo - Já em 1848, dez anos antes da publicação de O Livro dos Espíritos, Marx  já buscava desenvolver sua tese com base nos eventos ocorridos na França, quando escreve uma série de artigos sob um titulo comum "As Lutas de Classes em França de 1848 a 1850" e usa pela primeira vez, o termo "ditadura do proletariado". Do mesmo modo que o Espiritismo, a sua proposta se agrega ao evolucionismo com a ideia de competição pela sobrevivência e propõe uma revolução, que ao mesmo tempo seria uma redenção materialista do mundo.

Qualquer estudioso desatento poderia imaginar que o marxismo enquanto doutrina social teria sido uma fuga ao sentimento religioso para um materialismo seco. Mas com base no exposto, o correto seria afirmar que sua proposta surge como uma fuga apenas de uma perspectiva espiritualizada para a redenção humana. Isso porque, de acordo com a proposta de Comblin (1968), o que se vê, é que o materialismo histórico de Marx foi de certa forma, um discurso religioso. Quando descreveu o sentido da história, Comblin (1968) também se referiu a uma visão religiosa oculta no marxismo, que muitas vezes passa desapercebida. Em seu entender, como um judeu que era, e possuidor de uma tradição religiosa, Marx se orientou numa linguagem tipicamente religiosa para expor sua doutrina socialista. De fato, para Comblin (1968), Marx reconstrói o mito das cosmogonias religiosas antigas. Em Marx

“os acontecimentos presentes são encarnação das forças que lutam para o nascimento do mundo. [...] Assim, no marxismo, a história toda até agora é o prelúdio ao advento do Homem Novo, é o preâmbulo da verdadeira história. [...] O proletariado é o verdadeiro Marduk, que lutou contra Tiamat, o capitalismo, e de sua carne tirou o Homem Novo, fundou a verdadeira criação.” (COMBLIM, 1968, p. 183).
Marx anunciava a redenção da história com base numa revolução social. Na visão de Comblin (1968)  o discurso de Marx se estabelece como uma batalha mítica entre deuses do bem e do mal, na busca de uma redenção, que culminaria com a chegada de uma humanidade nova, como a concretização do ser escatológico que se anuncia no discurso cristão. Por isso, para Comblin (1968), sem esse elemento de nenhum modo se poderia  explicar  o fascínio que o marxismo despertou nas massas. Ele não teria sucesso 
“[...] se não correspondesse a uma estrutura fundamental e um arquétipo do homem: de fato, o marxismo atingiu a região mais profunda da religiosidade humana, aquela que cria e anima os mitos fundamentais, os mitos da cosmogonia.” (COMBLIM, 1968, p. 183).
Mas como entendeu o Papa Bento XVI (2007, §21), o que trouxe a queda da doutrina marxista foi apenas um fato: Ao usar de um argumento tipicamente religioso, ele teria se esquecido do Mal presente no mundo, e falhou em não incluir a proposta de Deus em sua agenda. Marx teria se esquecido de que o homem é um ser concreto e não se cura o homem apenas de modo exterior.

O esquecimento de Marx frustrou a esperança humana original. Ora e qual esperança essa? De vida em plenitude. Uma esperança que sustentasse o ser em sua ordem interna e que sustentasse todas as demais. E sem uma esperança que desse sentido a todas as outras, o socialismo não correspondeu à esperança fundamental de redenção do ser. Por isso, a força revolucionária da religião. Com a queda do comunismo no Ocidente, abriram-se as portas da religiosidade nos países da Europa e da América do Sul. E ao contrário do espírito de descrença marcado pelos anos anteriores, o Cristianismo avança e permanece a religião mais popular do mundo no século 21.

Dilema - Como se percebe, o ser humano se acha premido de angústias em busca de sua identidade e de sua redenção integral, que abarque não somente o "espírito", à parte do "corpo" (como propagado pelo Espiritismo); nem mesmo o "corpo", à parte do "espírito" (como propagado pelo Marxismo); mas sim o homem total em toda a sua dimensão corporal, espiritual e social. Em uma palavra: O "ser"  na "História".

E bem aqui se percebem as falhas das ideologias espiritualista e materialista. A falha de Marx se revela na proposta de redenção apenas exterior, sem visualizar a necessidade de uma redenção que abarcasse não apenas a "história", mas todo o ser em sua necessidade transcendente. Por outro lado, o espiritualismo fornece apenas um rompimento com a matéria e com o corpo com sua rede de relações em sua dimensão histórica.

Assim, pode-se dizer que a existência se perde em um dilema. O homem se vê entre a encruzilhada dos caminhos: Deve decidir entre partir (espiritualismo) e ficar (materialismo). Essa angústia somente se responderia mediante uma esperança de uma redenção integral. Em meu pensamento, essa sede e esperança, como assim também entende Comblin, (1968), somente a mensagem autêntica do evangelho pode saciar. Nele, o Deus cristão invade a história, se faz carne e redime o ser e a história humana, possibilitando um novo começo em sua totalidade.

A convergência das propostas é a esperança de redenção. Mas em seu desenvolvimento, há divergências que tornam impossível uma conciliação.

Diante da insuficiência da esperança aventada pelo espiritualismo e pelo materialismo, a questão é: pode a fé cristã ser um discurso que sintetize em forma de promessa uma expectativa  de redenção que corresponda à esperança que se instala no coração humano? Em que perspectiva se orienta a esperança de redenção do ser no cristianismo bíblico?

Mas isso fica para outro post. - (Claudio Sampaio).

http://pastorclaudiosampaio.blogspot.com

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